terça-feira, 7 de setembro de 2010

Minha primeira vez

Era 1977 e o clima, uma ansiedade cinzenta. A alegria em preto e branco. A realidade em tecnicolor.

Luis Pinguinha, faltou ao trabalho para ficar picando papel. O Dario fez um balão enorme em preto e branco. O Muniz saiu pra comprar ingressos pra todos.

Não entendia nada do que via. Medo da massa. Virgem de estádio. De concreto o filhinho de seis anos, louquinho pelo Corinthians. Ingresso na numerada, que seguro morreu de velho. As colegas de escritório quiseram ir. As comadres com seus pimpolhos corinthianos, também.

Entrar no Estádio do Morumbi até que foi fácil. Coração disparado. Como sair daqui no final? Em volta só emoção. Multidão cadenciada entoava: “filhos da puta, filhos da puta”. Eram “guardas” que entravam com seus cães policiais. Alinhavam-se em campo para dar mais segurança. Segurança? Engrossar esse coral. Catarse popular. Desabafos anônimos em resquícios de ditadura.

Os olhos dos circundantes a brilhar. Ovação ao plantel corinthiano. A boca a salivar. Coração a saltitar. Entra a Ponte pra enriquecer o repertório de nomes feios.

Começa o jogo. A Jurema gritava:”Geraldão, minha paixão, Geraldão, minha paixão”! Virou bordão.

Bem depois e era já, aos 36 minutos, Zé Maria bate uma falta pela direita. A bola percorre toda a pequena área e vai parar no pé de Vaguinho. De bico, ele chuta a bola no travessão do goleiro Carlos. Na volta ela quica no chão e sobe para Wladimir cabecear. Em cima da linha, Oscar também de cabeça, salva. No rebote, a bola sobra pro pé direito de Basílio. Ele faz o gol. Quebrou o jejum de 23 anos! Festa no Morumbi. No cordão de isolamento até os guardas chorando.A torcida invade. Faz mal não.

Esperar a vida toda pra sair do estádio. Ainda assim, massa comprimida. A ‘numerada’ é pra poucos. A rampa de saída, pra todos. Neguinho segurava a bandeira no ombro.Enorme. No mastro de bambu, a cachaça já secara. Com a mão livre, batucava levemente nos traseiros de quem vinha à frente. A Jurema perdeu o radinho de pilha. Roubaram o guarda-chuva da Neuza.

Na rua lateral , o ônibus da torcida Ponte Preta. Se puseram a cantar:”Joga pedra na Geni, joga bosta na Geni”. O filho falou, vamos correr mãe? Melhor não, ela respondeu. “Então vou tirar a camisa”. “Não demonstre medo, que é pior, filho”. Uma pedra acertou o braço, outra maior nas costas. Lapidação bem agora? Uma viatura chegando. Ufa!
O resto foi o que vocês ouviram no rádio.

11.08.2010

Um comentário:

  1. E o Luiz Pinguinha ficou com a minha bandeira do Timão, emprestada para a ir ao estádio! Devolver, jamais! A bandeira que viu o Corinthians ser campeão vai ficar para lembrança do dia inesquecível! Não faz mal, foi por uma boa causa!

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