quarta-feira, 28 de março de 2012

A paz é um jeito de ser




"Vim da terra vermelha e do cafezal.
As almas penadas, os brejos e as matas virgens
Acompanham-me como o espantalho,
Que é o meu auto-retrato.
Todas as coisas frágeis e pobres
Se parecem comigo.
"- Candido Portinari (Brodósqui, SP, 1903 - Rio de Janeiro, RJ, 1962)


Choveu na véspera e durante a noite toda. Era uma sexta-feira de outono e a manhã nublada anunciava mais temporal.  Pouco tempo depois, o sol furou as nuvens e iluminou a mão espalmada com o mapa vermelho ao centro. Ofuscou as vistas, reluziu na arte. O azul do céu dominou a cena.  A beleza da arquitetura do Memorial da América Latina explodiu em cores e harmonia.

Revoadas de crianças e jovens, em algazarra, aguardavam para ver a exposição Guerra e Paz, de Portinari.

Ao chegar, nosso grupo foi recepcionado por Rodrigo Linhares, que enriqueceu a visita com seus conhecimentos e paciência.

Começamos pela Galeria Marta Traba, onde foi possível ver os 100 estudos preparatórios do pintor. Esboços, documentos históricos, e outras obras de colecionadores vindas de toda parte. Até de Londres e Milão.

Guerra e Paz é uma obra monumental doada pelo governo brasileiro, à sede da ONU em Nova York. Candido Portinari realizou esta encomenda do governo brasileiro, entre 1952 e 1956. Foram seus dois últimos e maiores murais.

Um planejamento de uma reforma no edifício da sede da ONU, possibilitou articulações entre o Governo Federal e empresas estatais, que viabilizaram o projeto Guerra e Paz. De fevereiro a maio de 2011, os painéis foram restaurados em ateliê no RJ. Em 2012 chega a São Paulo. Depois, seguirá em itinerância nacional e internacional até retornar à ONU, em 2013.

De volta ao pátio do Memorial com o sol a pino, atravessamos o “deserto”. Chegamos ao Salão de Atos Tiradentes. Imponentes painéis de 14m altura por 10 de largura, compostos por 28 placas de madeira compensada naval de 25 quilos cada, nos aguardavam.

Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia, disse Tolstoi.

Olhos rútilos, respiração suspensa e emoção contida. Apreciamos o contraponto entre o drama e a poesia, a fúria e a ternura.

De um lado, a força e a intensidade das tragédias provocadas pelas guerras, injustiças, desigualdades e fome. Do outro, a placidez dos folguedos, a alegria das brincadeiras, as artes e amizades das pessoas.

E na Biblioteca Latino Americana, mais arte na veia. Arte transformadora. Veias que se abrem à paz e ao bem viver.
A paz é um jeito de ser. 


Nota: Sem curso primário completo mas com muita tenacidade e talento Portinari tornou-se um dos mais famosos pintores das Américas.Produziu mais de 5 mil obras,de pequenos desenhos a grandes murais.


quinta-feira, 8 de março de 2012

Mulheres fortes

No crepúsculo da existência, intransponíveis ausências. Pernas bambas.
Senhoras do Lar Jésus Gonçalves. Se somar todas as idades, seculum seculorum.

Na represa de Guarapiranga, o circo Spacial. ‘Hoje tem goiabada?- Tem sim senhor. E o palhaço o que é?- É ladrão de mulher’.

Chegam claudicantes, radiantes. Bengalas pra que te quero. Ombro amigo tão sincero. Curiosidade que alegra. A gravidade, um desafio. Mais vale a suavidade. E viva a diversidade! Rara distração e muita superação. Tremenda descontração.

Aplausos. Tchauzinhos. Caras e bocas. Riem muito dos eternos palhaços. Espantam-se com a ousadia dos trapezistas e o talento dos malabares. Mágicas que intrigam, acrobatas que fascinam. Bailarinas que voam como seus pensamentos. Mais palmas para este espetáculo de luzes, ilusões modernas, picadeiros, equilíbrios e muito contorcionismo. Mandando a solidão pro espaço, apreciando a pipoca, sem querer voltar pra casa.

A primeira vez no circo é como um salto ornamental. Inolvidável. Um dia para sonhar e brilhar.

Um salto no espírito e garantia de ilusões encontradas na beleza deste dia ensolarado no inverno desta vida. Receita pra esquecer as dores e retornar à infância perdida.

Cai a tarde e bela lua cheia encerra o passeio, sinalizando um amanhã repleto de momentos para lembrar e contar.

São mulheres simples. São mulheres fortes.
E pra todas muita sorte.


Suely Aparecida Schraner - texto produzido em 26.06.2010