Por:
Suely Aparecida Schraner
Era uma casinha branca com portas e janelas azuis. Tinha
um pequeno jardim na frente, adornado com dálias, miosótis e lírios. Ali morava a avó e sua netinha. A casa situava-se na Vila Operária, em
Goiânia, Goiás. A sala era simples.
Tinha duas janelas. Sempre abertas durante o dia. Havia mais quatro cadeiras de
madeira e um oratório.
Ao lado, o quarto com duas camas de solteiro com colchões
de palha e outro oratório. A avó, devota de todos os santos, da virgem Maria e
do pai eterno, rezava fervorosamente todos os dias.
Na cozinha, tinha dois armários de madeira escura e sem
portas. As prateleiras eram forradas com papel cor de rosa. Este papel era
trocado toda semana. A netinha ajudava a recortar. Tinha flores vazadas e às
vezes, alguns furos feitos delicadamente com a tesoura, o que dava impressão de
renda. As panelas ficavam enfileiradas
em um jirau. De tão areadas a gente nem precisava de espelho. O chão da casa
era de terra batida. Aspergia-se um pouco de água antes de varrer. Vinha aquele
cheiro bom de terra molhada em dia de chuva. O fogão era à lenha, como em quase
todas as casas.
A netinha ajudava a buscar a lenha e catar gravetos.
A cozinha típica goiana assimilou muito da culinária
mineira, por causa da influência dos tropeiros.
Quando a neta acordava, o fogo já ia alto soltando faíscas em minúsculas
estrelas. A casa da avó, o seu céu de anil.
O café escoava do coador de flanela, exalando a festa do
amanhecer. O leite fervia criando natas grossas, que de tarde, viravam
manteiga.
Na hora do almoço a avó matava uma galinha das que viviam
soltas no quintal. Depenava, sapecava no fogo, lavava com sabão de pedra.
Raspava todo o excesso da pele e temperava. Alho, sal, manjericão, alecrim, açafrão
e cebola. Tudo da horta caseira. Depois,
ela preparava uma polenta.
O quintal era cercado por arame sem farpas. Na cerca, crescia chuchu e quiabo. A avó
pedia para a neta ir colher os quiabos mais verdinhos e tenros. Ela colhia porque era obediente e a avó
mandava. O quiabo lhe dava engulho. Antes, a madrinha lhe contara que o quiabo
nascia da baba dos bobos. Eles babavam,
a baba caía no chão e pronto: nascia o pé de quiabo. Naqueles rincões do Brasil
Central, tinha muito bobo que babava.
Nesse quintal, o forno à lenha varrido, esperava os
bolos, biscoitos, petas e pão doce que a avó fazia para vender.
Na casa da avó a infância e a vida passavam com muita
leveza. A pobreza era rica de cheiros,
cores, amores e brilho nos olhos.
Agora, sensações emanam transitando em ventos brandos da
memória enevoada.
Numa evocação afetiva, a neta cozinha e come quiabo com frango
e polenta. O quiabo frito, não tem baba.
08.10.2014
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